Lá fora caia uma chuva bonita, raios brilhantes cortavam o
céu e o barulho dos trovões os surpreendiam alguns segundos depois, ela estava
na cama, a janela com mais ou menos um palmo aberta deixava o clarão invadir e
molhava o cinzeiro apoiado no parapeito.
Rompendo o silencio do quarto ele perguntou: Não tem medo?
ela ainda de costas retruca; Medo de
que?
-Dos raios.
-Não, acho bonito.
Estendeu a mão até os cabelos dela e indagou:
-Do que você tem
medo?
-De baratas.
-Nenhum outro medo? Altura, água, choque, morte, não tem
nenhuma resposta melhor que barata?
-Gosto de altura, de água, não tenho problema com choque,
com dentista, acho que morrer pode doer, mas não tenho exatamente medo. Tudo
que é muito me assusta, pensar em muitas baratas, muitas vacas, muita água.
-Você tem medo do amor?
Ela até então de costas virou-se para ele e após um breve
silencio respondeu.
-Ninguém tem medo de amor, as pessoas tem medo de sofrer, de
se decepcionar, de que tudo dê errado...
Colocando a mão sobre o rosto dela, ele se inclinou lhe deu
beijo e disse:
-Não perguntei das pessoas, perguntei de você.
Olhando aquele rosto tão conhecido, tão dela, se manteve em
silêncio.